Artigo por Ágata Turni.
O etanol de milho, um biocombustível que redefiniu a matriz energética dos Estados Unidos, agora emerge como vetor de transformação em todo o continente americano. O que começou como uma política estratégica de segurança energética na América do Norte se desdobra em um movimento que conecta EUA, Brasil e demais países do continente, com implicações diretas para o agronegócio, a transição energética e o mercado global de commodities.
Este artigo técnico, elaborado sob minha perspectiva como especialista com mais de 15 anos de experiência no agronegócio e bioenergia, apresenta uma análise aprofundada sobre o papel do etanol de milho nas Américas e suas oportunidades para o Brasil.
2. A Revolução do Etanol de Milho nas Américas
A história do etanol de milho nas Américas tem como ponto de partida os Estados Unidos, onde o biocombustível se consolidou como peça central da política energética. Desde o século XIX, com experimentos pioneiros em motores a etanol, até a visão de Henry Ford ao projetar veículos capazes de rodar com combustíveis renováveis, o etanol foi visto como alternativa promissora.
Apesar de ter ficado em segundo plano durante a era do petróleo barato, o combustível voltou à pauta após a crise do petróleo dos anos 1970, que expôs a vulnerabilidade energética norte-americana. A partir daí, a indústria ganhou força com incentivos fiscais, subsídios e, sobretudo, com a criação do Renewable Fuel Standard (RFS) em 2005, que estabeleceu metas obrigatórias de mistura de biocombustíveis à gasolina.
O resultado foi uma transformação sem precedentes: em apenas duas décadas, a produção americana saltou de 6 bilhões de litros em 2000 para cerca de 58 bilhões em 2023. Hoje, o etanol de milho não só responde por uma fração significativa do consumo doméstico de combustíveis nos EUA, mas também influencia o mercado global de grãos e as cadeias de exportação.
Esse movimento foi determinante para a América como um todo. De um lado, consolidou os EUA como referência tecnológica e política em biocombustíveis. De outro, abriu caminho para países como o Brasil, que passaram a enxergar no milho um vetor complementar à cana-de-açúcar. Assim, a revolução iniciada nos Estados Unidos começa a se expandir pelo continente, redesenhando as estratégias de segurança energética, competitividade agrícola e descarbonização.
3. O Mercado Atual e as Tendências de Crescimento
O mercado de etanol nas Américas é hoje essencialmente binacional, liderado por EUA e Brasil, responsáveis juntos por aproximadamente 80% de toda a produção global. Essa concentração reflete tanto a escala agrícola dos dois países quanto sua capacidade de estruturar políticas industriais voltadas para a bioenergia.
- América do Norte: os EUA seguem como epicentro da indústria, sustentados por infraestrutura moderna, forte apoio governamental e investimentos em inovação. Além de abastecer o próprio mercado interno, o país tem papel relevante nas exportações, sendo fornecedor estratégico para países que buscam alternativas aos combustíveis fósseis.
- América do Sul: o Brasil, tradicional potência no etanol de cana-de-açúcar, desponta como novo polo na produção a partir do milho. Essa diversificação fortalece a segurança energética, reduz a dependência de uma única matéria-prima e aproveita o potencial produtivo da região Centro-Oeste, que alia abundância de grãos a logística de escoamento para mercados internacionais.
As projeções são robustas. O mercado global de etanol deve crescer de US$ 91,7 bilhões em 2023 para mais de US$ 158 bilhões até 2033. Esse salto será sustentado por fatores como:
- Transição energética: pressões regulatórias e compromissos climáticos impulsionam a busca por combustíveis de baixo carbono.
- Novas aplicações: o etanol será insumo estratégico para a produção de SAF (combustível sustentável de aviação), bunker marítimo, hidrogênio verde e petroquímicos renováveis.
- Demanda crescente: a aviação e o transporte marítimo, setores de difícil eletrificação, tendem a absorver volumes crescentes de biocombustíveis.
Para o Brasil, esse cenário representa mais do que crescimento: significa se posicionar como protagonista na bioeconomia global, aproveitando a complementaridade entre milho e cana para fornecer energia limpa e diversificada.
4. O Etanol de Milho no Brasil: Implementação e Diferenciais Técnicos
A jornada brasileira com o etanol de milho é recente, mas transformadora. A primeira planta flex, inaugurada em 2012, marcou o início de um novo ciclo para o setor sucroenergético. Essa inovação permitiu aproveitar a capacidade ociosa das usinas de cana durante a entressafra, garantindo produção contínua de etanol ao longo do ano.
Poucos anos depois, em 2017, surgiu a primeira usina full, dedicada exclusivamente ao milho, operando praticamente sem interrupções anuais. Mais recentemente, o modelo full-flex trouxe ainda mais eficiência, ao integrar milho e cana em um mesmo complexo industrial, ajustando a produção conforme a disponibilidade de matérias-primas e as condições de mercado.
O impacto dessa evolução é impressionante: de 11 milhões de litros em 2013 para 4,5 bilhões em 2023, com expectativa de alcançar 6 bilhões de litros na safra 2023/2024 — um crescimento acumulado de cerca de 800% nos últimos cinco anos. As projeções indicam que a produção pode chegar a 48 bilhões de litros até 2034, consolidando o milho como pilar definitivo da bioenergia brasileira. Hoje, o milho já responde por cerca de 20% do etanol nacional.
O Mato Grosso lidera a expansão, concentrando 70% da produção nacional e contando com novas usinas em construção. Nesse estado, o milho já superou a cana como principal fonte de etanol. Além do combustível, os coprodutos elevam ainda mais a relevância econômica:
- DDGS (grãos secos de destilaria): proteína de alto valor para nutrição animal, fundamental para a pecuária de corte e leite.
- Óleo de milho: insumo para ração, biodiesel e outros segmentos industriais.
- Cogeração de energia: aproveitamento da biomassa para geração elétrica.
Onde o milho realmente se destaca é no rendimento industrial: uma tonelada de milho produz entre 370 e 460 litros de etanol, enquanto uma tonelada de cana rende cerca de 43 litros. Essa diferença explica a competitividade das usinas dedicadas ao grão e reforça a viabilidade econômica do modelo.
Esses diferenciais consolidam o etanol de milho como solução integrada para energia, proteína animal e descarbonização. Mais do que um combustível, ele se tornou parte de uma estratégia nacional de competitividade agrícola e bioenergética.
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Conclusão
O etanol de milho deixou de ser uma experiência localizada nos Estados Unidos para se consolidar como um movimento continental, com impactos profundos no Brasil. Com a integração das cadeias de milho e cana, somada à pressão global por combustíveis renováveis, o país tem diante de si uma oportunidade única de liderança.
A revolução que começou na América do Norte agora encontra no Brasil um novo capítulo – e o futuro do agronegócio passa por compreender e aproveitar essa tendência estratégica.